Tendências e hábitos de consumo ligados ao bem-estar e ao maior contato com a natureza inspiram empreendedores

Conexão. Significado. Bem-estar. Impacto positivo. No contraponto da rotina moderna, acelerada, com agendas cheias e metas a bater, os viajantes priorizam um destino que favoreça a reconexão consigo mesmo e com a natureza, a autenticidade de culturas e aprendizados transformadores, o autocuidado físico e mental, e a consciência ambiental e social.

Você é resultado das suas escolhas, certo? E o caminho que molda o futuro do turismo também é um reflexo das novas necessidades, dinâmicas de vida e valores que permeiam a sociedade atual. Cada vez mais, descanso e lazer não bastam na hora da decisão de um roteiro. A palavra da vez é experiência.

Aliar turismo à sustentabilidade foi o caminho escolhido por Mayris do Nascimento, lá em 2016. O Nosso Mangue era para ser somente um projeto voltado para a educação ambiental. Mas hoje, é uma startup, um negócio de impacto socioambiental que promove o turismo de experiência com base no turismo regenerativo, além da recuperação, preservação e conservação dos manguezais, com a compensação de carbono.

O negócio destaca a importância de se preservar o mangue do Pontal da Barra, em Maceió. Até o momento, já foram plantadas mais de 20 mil mudas nativas de mangue branco, vermelho e preto, em uma área antes desmatada. “O intuito é gerar cada vez mais impacto, provocando essa conscientização para a preservação ambiental, estimulando e fazendo com que a economia gerada pelo negócio circule dentro da comunidade, contratando pessoas e comprando insumos no próprio bairro”, garante Mayris.

No Nosso Mangue, as pessoas vão vivenciando o manguezal, descobrindo a sua relevância, seus benefícios para o ecossistema e para as comunidades ribeirinhas da região, colocam o pé na lama e plantam uma semente nativa para perpetuar esse bioma. “Minha promessa para o futuro é crescer impactando e trazendo cada vez mais a comunidade para vivenciar este ecossistema, e sermos todos os protetores do mangue”, defende Mayris do Nascimento.

Pesquisas do Sebrae Alagoas apontam que 78% dos turistas que visitaram o estado em 2023, buscaram vivências que os conectassem com a cultura local e a natureza. Essa procura por atividades de ecoturismo e turismo cultural em Alagoas, segundo o Ministério do Turismo, cresceu 20% nos últimos dois anos. Não à toa, em 2023, o estado recebeu o selo “Destino Sustentável”, do Ministério do Turismo, reconhecendo as iniciativas locais de preservação ambiental.

Enxergando oportunidades

Conhecer bem o roteiro e as potencialidades da região são os primeiros passos para o sucesso do turismo de experiência. E nada melhor que um nativo, filho de pescador, criado na lagoa, para transformar as belezas da Reserva Extrativista de Jequiá da Praia em um negócio promissor.

Aqui, começamos a história do Alyson Cardoso, da Eco Boat Lagoa de Jequiá. Formado em Biologia, viu-se inquieto com a oportunidade de explorar o turismo ecológico e contribuir com a geração de emprego e renda dentro da própria comunidade, já que a maioria das pessoas precisava sair da região para buscar trabalho e manter a família.

“No início foi bem difícil, a gente começou pegando embarcações de pesca comum, com coletes emprestados, num roteiro bem simples que focava no Rio Gelado – um lugar onde a comunidade frequentava para tomar banho, comemorar aniversário e passar o fim de semana, porque já era um ponto de encontro, mas nunca voltado para o turismo”, relembra Alyson.

A ideia ganhou aliados. O empreendedor convenceu a mãe a cozinhar, o pai se envolveu na organização dos passeios, os amigos e a irmã ajudaram na formatação das trilhas, e hoje, a equipe formada por moradores da região oferece um passeio ecológico legalizado, totalmente sustentável.

O roteiro começa com uma travessia de cerca de 30 minutos da Lagoa de Jequiá, chegando no Rio Gelado, onde é explicado sobre a cultura e a história local, com a visualização de algumas árvores centenárias. Em seguida, a equipe desce o rio, numa flutuação com coletes, provocando um choque de sensações com as águas frias e o encontro com a lagoa.

De lá, inicia-se a experiência gastronômica, com a Peixada da Leidinha, preparada pelas mãos da mãe do Alyson que, inclusive, recebeu uma premiação e foi eternizada no livro de gastronomia alagoana da jornalista Nide Lins, com ênfase para o pirão caseiro. “A gente vai passar pela lagoa, pelo rio, pelas falésias. Vai ter história, vai ter cultura, vai ter gastronomia e depois, encerramos na praia”, sintetiza o empreendedor.

Alyson revela que já conseguiu alcançar algumas conquistas para impulsionar a divulgação do roteiro na região. “A gente foge do turismo massivo, aquele turismo que acaba degradando todo o ambiente. Já recebemos o Zeca Camargo; saímos no programa Isso É Alagoas, da Gilka Mafra; ganhamos a mídia, temos um Instagram bem movimentado; e recebemos muitos famosos, o que tem dado um boom na Região Lagunar, mas sempre prezando por um turismo consciente”, revela Alyson Cardoso.

“Trabalhamos somente com pessoas e produtos locais, o camarão e o peixe são comprados de pescadores da própria comunidade, fazemos ações de limpeza, temos muitas associações parceiras do projeto e, além disso, inspiramos outras pessoas a fazerem roteiros parecidos”, celebra com orgulho.

E o futuro é favorável. Alyson compartilha que o feedback do seu público está alinhado com o seu modelo de negócio. “A gente tem um perfil de visitante que gosta de ecoturismo, e muitas pessoas acabam se conectando muito com a natureza. Dizem que o lugar traz muita paz, a experiência é renovadora, o lugar foge do tradicional, é bem preservado, e isso contribui muito para que as pessoas tenham essa reconexão, meditem, reflitam sobre si e sobre suas vidas”, registra.

Staycation chegou pra ficar

Se a dinâmica do mundo mudou, as necessidades da sociedade também evoluíram. O trabalho remoto possibilita viagens mais curtas e com mais frequência, durante todo ano; a alta conectividade oferece pesquisas online e reservas imediatas, dando autonomia e pessoalidade ao planejamento da viagem. E para se destacar na multidão, os turistas buscam por experiências sob medida, com roteiros exclusivos, mesmo que invistam mais recursos para isso.

“Não há quem não morra de amores pelo meu lugar”, já dizia o cantor e compositor alagoano Eliezer Setton. E a fim de desbravar os cenários, as histórias e a cultura da própria região, é crescente a busca por novas experiências, sem precisar ir muito longe de casa.

O foco, agora, é a vivência, aproveitando o momento presente. A busca é por valores alinhados à filosofia de vida, então, conhecer a origem dos produtos e serviços que consomem, é decisivo.
A terra das lagoas, mares e mangues, rios e serras, com paisagens e histórias ricas, do Sertão ao Agreste, da Zona da Mata ao Litoral, desponta no conceito de staycation, aliando inovação, novas conexões e qualificação profissional, de olho nas tendências.

É preciso, porém, identificar as oportunidades. E os pequenos negócios podem se beneficiar dessa tendência, a exemplo da Eco Boat, com descontos para moradores da região, ofertas para grupos e famílias, pacotes com experiências gastronômicas e culturais. Podem investir também na criação de conteúdo online, parcerias com influenciadores, participação em feiras e eventos de turismo e, ainda, com a criação de roteiros temáticos, pacotes com atividades personalizadas e experiências únicas para a população da região.

Somente em 2023, o número de viagens de alagoanos para destinos dentro do próprio estado aumentou 40%. E segundo a Secretaria de Estado do Turismo, as campanhas promocionais e a valorização das belezas naturais de Alagoas são os principais fatores que impulsionaram esse resultado.

Turismo regional em alta

Segundo o Ministério do Turismo, em 2023, Alagoas registrou um aumento de 25% no número de viagens rodoviárias dentro do Estado. E outra pesquisa da Secretaria de Estado do Turismo mostrou que 70% dos turistas que visitaram Alagoas, neste mesmo período, pretendiam conhecer outros destinos locais em suas próximas viagens.

Para não deixar passar essa tendência de roteiros mais curtos e próximos de casa, é importante que o empreendedor do turismo adote novas práticas para se destacar no mercado. Criar roteiros temáticos, com foco em gastronomia, aventura ou passeio familiar; exercitar a parceria com outros negócios do setor produtivo, com a criação de pacotes combinados com hotéis, restaurantes, agências de turismo e outros prestadores de serviços; e ainda, promover a divulgação do destino em redes sociais, sites especializados, blogs e outros canais digitais.

Por isso, conhecer as novas tecnologias, identificar o seu público e se apropriar dos canais de divulgação dos seus produtos e serviços é fundamental. “Para se adaptar às novas tendências, mantendo-se competitivos nesse cenário de transformação, é importante investir no trabalho em equipe, garantindo uma experiência positiva de ponta a ponta para o cliente; capacitar continuamente seus funcionários; e buscar novas ideias e soluções que façam sentido para o seu público”, acrescenta o analista do Sebrae Alagoas, Washington Lima.

Como implementar as tendências, na prática

Para se manterem competitivos e relevantes nesse cenário dinâmico, os pequenos negócios precisam estar atentos às mudanças, se adaptar às expectativas do cliente e se unir a ideias que potencializem seus produtos ou serviços.

Mas, como atender aos anseios desse viajante moderno? Para desacelerar e recarregar as energias, os destinos naturais e as atividades ao ar livre estão em alta. Os pequenos negócios podem se destacar com a promoção do ecoturismo e aventura, oferecendo trilhas guiadas, esportes aquáticos, observação de fauna e flora e turismo rural; com opções sustentáveis, como glamping (um jogo de palavras que significa acampar com glamour, hotéis ecológicos e alimentação orgânica.

Outro item fundamental é valorizar a preservação dos ecossistemas, com passeios com foco na educação ambiental, conscientização sobre sustentabilidade e apoio a projetos de conservação. Se o objetivo é criar experiências únicas, conectadas à alma do destino turístico, vale a pena promover uma imersão cultural, como fez Alyson Cardoso, da Eco Boat.

Valorização das histórias e vivências locais, com tour guiado por moradores, oficinas de artesanato tradicional e degustações de culinária regional, por exemplo; oferecendo acomodações charmosas, é o caso de pousadas temáticas, hotéis boutique com arquitetura local e chalés em meio à natureza; e conexão com a comunidade, participando de festivais locais, interagindo com artesãos e projetos sociais.

As viagens responsáveis e com impacto positivo na comunidade são cada vez mais procuradas. Então, assim como fez a Mayris do Nascimento, do Nosso Mangue, os pequenos negócios do setor podem buscar reduzir o consumo de água e energia, utilizar materiais reciclados e realizar o descarte correto de resíduos; conscientizar para a preservação do ecossistema. Além disso, devem promover a inclusão social, contratando mão de obra local, apoiando cooperativas e pequenos produtores, e dar acessibilidade para pessoas com deficiência, contribuindo para um futuro mais justo e sustentável.

Saúde e bem-estar

E para aqueles turistas que buscam experiências que promovam o bem-estar físico e mental, é possível implementar atividades que favoreçam uma vida mais plena e equilibrada, como retiros e spas, oferecendo programas de yoga, meditação, massagens, alimentação saudável e detox, por exemplo; e com parcerias profissionais, contando com a colaboração de nutricionistas, psicólogos, instrutores de yoga e outros profissionais da área holística e da saúde.

Uma pesquisa do Sindicato dos Hotéis, Restaurantes, Bares e Similares de Alagoas apontou que 65% dos hotéis do estado já oferecem esse tipo de pacote com foco em saúde e bem-estar; e 82% dos turistas que visitaram Alagoas, em 2023, consideraram importante a adoção de práticas sustentáveis pelos hotéis e pousadas.

O turismo em Alagoas é uma cadeia produtiva vocacionada para o empreendedorismo. Segundo o analista do Sebrae Alagoas, Washington Lima, por meio da metodologia de Ecossistemas Locais de Inovação, a Instituição está promovendo uma série de ações para engajar os integrantes desse setor produtivo, gerando conexões e fomentando a inovação com estratégias baseadas em processos e tecnologias que estimulam destinos turísticos inteligentes no mundo inteiro.

Para ele, o primeiro ponto a ser destacado nessa iniciativa é a socialização do conhecimento sobre as tendências, macrotendências e microtendências no turismo. E depois, a conexão com outros negócios, favorecendo a formação de parcerias.

“Essa sensibilização vai trazer um impacto mais positivo para o cliente, porque ele vai ver, primeiramente, a responsabilidade social e ambiental; vai perceber que as empresas estão atentas a esse cenário e, além disso, vai ter uma experiência diferenciada, reconhecendo que a empresa está se preocupando com a inovação, seja com um serviço mais personalizado ou pela praticidade na reserva. E a médio e longo prazo, as empresas poderão colher esses resultados práticos de mercado”, finaliza o analista do Sebrae Alagoas, Washington Lima.

Como dizia Geraldo Vandré, “vem, vamos embora, que esperar não é saber. Quem sabe faz a hora, não espera acontecer”. Ressignificar os papéis e construir essa cadeia do turismo num espírito colaborativo, inquieto por conhecimento, movido por inovação e atitudes positivas para o futuro parece ser mesmo o melhor cenário para o futuro do setor – que já se molda no presente.