Trabalhar menos, se sentir melhor e ainda ser mais produtivo: isso soa como ganhar na loteria, tanto para funcionários quanto para empresas. Uma iniciativa testou neste ano na Alemanha a semana de quatro dias e os resultados deste experimento, apresentados no final de outubro, mostraram os benefícios para a saúde de empregados.

Ao todo, 45 empresas e organizações na Alemanha participaram do experimento, que estipulou a redução da jornada de trabalho para uma semana de quatro dias por seis meses, mas sem reduzir os salários. A iniciativa foi promovida pela consultoria Intraprenör, que trabalha com a ONG 4 Day Week Global (4DWG). No entanto, o que parecia maravilhoso no início se revelou bem menos espetacular.

Duas empresas encerram o experimento antes do prazo, outras duas desistiram de passar pela avaliação e, entre as 41 empresas restantes, apenas um terço delas reduziu realmente a jornada de trabalho em um dia. De acordo com Marika Platz, pesquisadora da Universidade de Münster que participou da avaliação do projeto, 20% das empresas reduziram as horas de trabalho entre 11% e 19% e cerca da metade das empresas reduziu a carga horária em menos de 10%, ou seja, quatro horas ou menos por semana.

O experimento avaliou o impacto da redução na saúde. Trabalhar menos pelo mesmo salário e obter o mesmo resultado supostamente só seria possível com um aumento na produtividade, o que poderia acarretar mais estresse e uma carga de trabalho maior. Para essa análise, além de entrevistas, os pesquisadores avaliaram amostras de cabelos para medir o estresse e dados fisiológicos, como qualidade do sono, frequência cardíaca e níveis de atividade.

Os resultados: os funcionários se sentiram melhor com a redução da carga horária e ainda foram tão produtivos quanto numa semana de cinco dias, em alguns casos, foram até mais produtivos. Segundo Julia Backmann, diretora científica do estudo e professora na Universidade de Münster, os participantes relataram melhorias significativas na saúde mental e corporal. Houve uma redução de estresse e de sintomas de burnout, conta.

“Dois em cada três funcionários afirmaram haver menos distração e que os processos foram otimizados. A metade das empresas mudou o formato de reuniões, que passaram a ser menos frequentes e mais curtas. Uma em cada quatro empresas passou a usar novas ferramentas digitais para aumentar a eficiência”, destaca Backmann.

“O potencial de reduzir a jornada de trabalho parece estar latente sob processos complicados, reuniões e pouca digitalização”, resume Carsten Meier da Intraprenör.

Pouco impacto para o meio ambiente

O experimento mostrou ainda que funcionários ficaram mais ativos, o que contribui para a melhora no bem-estar durante a semana de quatro dias. Os participantes do estudo também dormiram em média 38 minutos a mais do que aqueles que trabalhavam cinco dias por semana.

As faltas por doença, porém, diminuíram muito pouco. A diferença com relação ao mesmo período de 2023 foi insignificante. “Isso foi uma surpresa, porque experimentos semelhantes realizados em outros países mostraram uma redução significante no número de dias de licença médica”, afirma Platz.

Outra surpresa, segundo a pesquisadora, também foi o fato de a redução não ter registrado nenhum efeito positivo para o meio ambiente. “Em outros países, houve efeitos positivos para o meio ambiente, porque escritórios puderam ficar fechados por um dia. Houve também economia de energia pela diminuição do deslocamento até o local de trabalho.” Na Alemanha, porém, os funcionários aproveitaram o dia extra para viajar no fim de semana mais longo, o que anulou essa economia, afirma Platz.

Os pesquisadores também afirmam que a redução da jornada poderia ter um efeito positivo sobre a escassez de mão de obra qualificada que o país enfrenta. A lógica por trás dessa conclusão: uma semana de quatro dias poderia motivar pessoas que não estão preparadas para trabalhar cinco dias e, portanto, estão atualmente fora do mercado de trabalho.

Resultados questionados

O especialista em mercado de trabalho Enzo Weber critica os resultados do experimento. O pesquisador da Universidade de Regensburg e do Instituto para Pesquisa sobre Mercado de Trabalho e Ocupacional afirma que as empresas que participaram do projeto já tinham uma postura favorável à semana de quatro dias. Assim, portanto, elas não seriam uma seção transversal representativa da economia.

Empresas com concorrência internacional preferem não participar desse tipo de experimento, acredita Steffen Kampeter, presidente da associação de empregadores BDA. Ele também duvida do aumento da produtividade. “Uma semana de quatro dias com equiparação salarial total é apenas um grande aumento salarial que a grande maioria das empresas não pode pagar”, ressalta Kampeter.

Weber lembra ainda que durante o experimento não ocorreu somente a redução da jornada de trabalho, mas também mudanças em processos e na estrutura organizacional. Por isso, segundo ele, o aumento da produtividade não está necessariamente ligado à redução da carga horária.

O especialista também questiona os resultados positivos, pois, na sua opinião, a redução da jornada provavelmente levaria a uma intensificação do trabalho, com elementos sociais, criativos e comunicativos sendo deixados de lado. “As empresas geralmente sentem as consequências a médio prazo. E o estudo só avaliou seis meses.”

Como continua

Mais de 70% das empresas que participaram do experimento querem possibilitar a seus funcionários a semana de quatro dias, outras devem estender a fase de teste e algumas delas afirmaram que vão adotar a medida imediatamente.

No entanto, uma redução da jornada semanal não é praticável em todos os setores. Maquinistas de trem, motoristas de ônibus, lojistas, professores, policiais, bombeiros, médicos e enfermeiros não têm como aumentar a produtividade ao reduzir a carga horária.

Backmann ressalta que o estudo não tinha o objetivo de propagar uma introdução abrangente da semana de quatro dias, mas testar “um modelo de trabalho inovador e seu efeito”.

Fonte: Viva Bem /UOL

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