Ginasta vira a maior atleta do Brasil nas Olimpíadas em cenário que não parece real: com um ouro no solo e sob devoção de Simone Biles
Deve ter sido uma grande encenação, um teatro coletivo que começou lá em 1896, na primeira edição das Olimpíadas, e se espichou até o ato final, até esta segunda-feira, 5 de agosto de 2024 – até aquele momento em que Simone Biles curvou o corpo e reverenciou Rebeca Andrade no alto do pódio nos Jogos Olímpicos de Paris.
É tão perfeito que não pode ser real. Não é que Rebeca Andrade simplesmente tenha se tornado a maior medalhista da história brasileira: ela se tornou a maior medalhista da história brasileira ganhando um ouro. E na final do solo. E contra Simone Biles. E sendo reverenciada no pódio pelo maior ícone moderno da ginástica artística – feito uma rainha que acabasse de herdar o trono de sua antecessora e agora recebesse sua devoção.
Foi tudo uma farsa – só pode. O saque de Marcelo Negrão contra a Holanda em 1992, o ouro de Cesar Cielo em Pequim, Jaqueline e Sandra em Atlanta, aquela vitória desesperadora contra a Rússia no vôlei feminino em 2012, Joaquim Cruz em Los Angeles, Vanderlei Cordeiro e o padre maluco: tudo uma enorme representação coletiva.
Porque se for verdadeiro, significará que toda nossa história olímpica (tudo que vibramos, tudo que choramos, o tanto que nos orgulhamos e nos irritamos) foi milimetricamente desenhada para desembocar naquele ginásio em Paris. Significará que as Olimpíadas reservaram para aquela atleta, naquela apresentação de solo, o posto de maior emblema da história olímpica brasileira: justamente para alguém capaz de pegar elementos tão nossos (o esporte, a dança, a música), misturá-los e fazer nascer a arte.
Se não for tudo um grande engano, o Brasil terá encontrado a heroína olímpica perfeita, uma figura que nem sabíamos que procurávamos: o sorriso, a doçura, a explosão atlética. E então ali, naquela jovem negra saída de uma infância pobre em Guarulhos, estará a maior de todas: a primeira dona de seis medalhas, a primeira brasileira campeã olímpica no solo.
A gente não pediria tanto. Deve ser um sonho – adormecemos entre alguma prova de canoagem e algum jogo de tênis de mesa e agora estamos aí, fantasiando com o dia em que Rebeca Andrade ganhou a medalha de ouro na final do solo, se tornou a maior atleta olímpica brasileira e foi reverenciada por Simone Biles no pódio.
Não seria bom demais para ser verdade?
Fonte: GE.Globo – Blog do Alliatti
Foto: Reuters